Avenida Nove de Julho, São Paulo.
O sinal está vermelho e dou continuidade à minha viagem espacial. Sim, para dirigir em São Paulo é preciso visto para o espaço sideral, caso contrário seu percurso será um tédio, e de tédio já basta a Narcisa Tamborideguy no anuncio da OLX.
Vejo um homem, por volta dos seus quarenta e poucos anos oferecendo guarda-chuvas aos carros da frente.
Paro.
Presto atenção nele.
O cara vende guarda-chuva para viver.
Ele passa o dia todo andando entre vidros fechados.
Esse é o emprego do cara.
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Volto para os Emirados Árabes e lembro que naquele país não há desemprego.
Lembro-me da simpática guia espanhola falando dos Sheiks com admiração.
A vida para o estrangeiro naquelas terras é difícil, muito difícil, mas mesmo assim ela carrega um semblante de orgulho.
Confesso que cheguei por lá com nariz torto. A ostentação excedente me incomodava, e a minha ignorância me ajudava a contribuir com meu pé atrás.
Porém, lá descobri que o governo fornece todo e qualquer auxilio ao nativo. Ele dá casa, transporte, saúde. O governo, inclusive oferece cerca de USD 20.000 como bonificação para o nativo que se case com uma nativa – uma forma de preservar uma cultura onde apenas 10% da população do país é local.
Os Sheiks também ajudam os países vizinhos e com o dinheiro que sobra (sobra, isso mesmo) constroem aquelas insanidades que vemos no Discovery Channel ou ao vivo, como no meu caso.
Vi com meus próprios olhos a diferença que faz o dinheiro do petróleo quando bem usado. Eles construíram cidades no deserto, cidades arborizadas, cada resquício de galho tem uma mangueirinha de água dessalinizada (!!).
E olha que os caras só produzem petróleo. Só!
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Nove de Julho, novamente.
O moço vende guarda-chuvas mais classudos, não aqueles de cinco reais que brotam na Av. Rio Branco quando o mundo desaba.
Ele se aproxima do meu carro e rapidamente volto da minha viagem que construí naqueles instantes.
Sorrio e faço que não, obrigada.
Ele reage com um sorriso.
Oferece de novo seu guarda-chuva fancy, devolvo novamente com um sorriso e um obrigada.
Tive a impressão que naquele momento não havia mais uma chance de venda, e sim uma chance de ter sido visto.
Vidros fechados.
Constantemente ignorado, aquele cara se viu visto.
Carregava perto do cotovelo uma seleção de guarda-chuvas infantis, coloridos e cheios de desenho.
Com as minhas negativas, ele ofereceu os guarda-chuvas de criança.
Eu ri.
Ele riu.
O sinal abriu.
Saí de lá sorrindo.
Ele ficou, sorrindo.