Eram duas velhinhas na mesa ao lado, elas bebiam vinho e fofocavam sobre a vida e os acontecimentos recentes. Até que uma delas interrompe seu animado bate-papo e me pergunta:
– Minha filha, aquele prato eu sei o que é, mas e o seu? É o que?
– É um kibe vegetariano com uma saladinha.
– Mas e dentro desse potinho?
– Hm… É pão.
– Mas que pão?
– Sírio, torradinho e picado.
– Ah sim! Vi passarem alguns kibes hoje, mas eram kibes kibes.
E ela continua:
– Você conta tudo?
– Desculpa?
– Não pode contar tudo.
Um ponto de interrogação pula à minha esquerda da cabeça. E de repente, a interrogação vira exclamação.
– Contar tudo!
Ri meio desconcertada, ela referia-se ao meu livro, que estava em cima da mesa encostado na parede, “Contar Tudo” de Jeremias Gamboa.
Diante da minha opção vendida daquele papo, a senhorinha gentilmente falou:
– Desculpe! Terceira idade, vocês sabem como é que é.
Ela rachou a conta com a amiga, pegou sua bolsa e ainda falou algo como: Não pode, você bebeu!
E assim aquela senhorinha foi embora da minha vida, tendo transmitido, quem sabe, a sabedoria de alguém que pode ter tomado muito na cabeça por ter sido sincera demais.