ENGRAÇADINHO

ENGRAÇADINHO

No vagão sem meu método de invisibilidade – os fones de ouvido – sou obrigada a escutar o papo de duas conhecidas, que se encontraram acidentalmente a caminho do trabalho, o papo estava totalmente fora da minha área de interesse por motivos óbvios – eram pessoas estranhas – logo, quase me ninavam no chacoalhar dos trilhos.

– Oi quanto tempo!

– Pois é!

– Que coincidência! Você estava morando no Canadá não estava?

– Sim, sim. Quero voltar para lá correndo.

Bla, bla, bla, bla.

Vez ou outra eu entrava na frequência do papo, enquanto me entretia com meu tamagotchi Steve Jobiano.

– Assim que eu terminar a Pós eu me mando de novo para lá (…), faço lá no Mackenzie (…) mas não estou muito animada não (…)

Faltando um milésimo de segundos para eu sair da frequência da Pós da vizinha de banco, sou interrompida aliás, aquelas meninas são interrompidas por um cara sentado ao lado delas:

– Desculpa interromper o papo de vocês.. Mas se a aula fosse boa você deveria estudar no “Bomckenzie”.

Silêncio.

Silêncio.

SILÊNCIO.

Continuo com os olhos pregados no celular e pensando: Esse cara não mandou uma dessa, ela é tão horrível que chega a ser boa.

O vagão estava cheio e eu conseguia ouvir a pulsação do maquinista lá na frente tamanho o silêncio gerado.

– Não, não teve a mínima graça. Retrucou a mocinha, que não era a Luiza mas que havia voltado do Canadá.

Ouuuuuch, pensei “mais sem graça que top model magrela na passarela” (alô Moska). Fiquei tão sem graça que parecia que o fora era para mim (um pouco sim, afinal tinha achado tão ruim que havia sido boa). Me recusei a levantar a cabeça e identificar o fora-dado. Achei que ela havia pego meio pesado, mas como o papo não era do meu bedelho, quiçá o fora dado.

– É, foi péssima. Confessou o engraçadinho.

As pessoas voltaram a respirar, o cara ficou calado e resolveu ir para perto da porta. Evitei qualquer tipo de eye-goodbye-contact. O constrangimento era enorme.

Pelo que entendi, parece que o cara já estava perto da Luiza do Canadá desde Carapicuíba e estava rezando em voz alta e dando benção para todos. Depois ficou escarrando alto.

OK OK, Luiza já deveria estar irritada com o mocinho irreverente.

Quando a estação de Pinheiros estava próxima, me levantei para me posicionar perto da porta, já que sairia em duas estações.

Para quem não conhece São Paulo, o trem e o metrô da Estação Pinheiros são como a Sé para mim. É a maior referência de formigueiro humano e de entrada de boiada que já conheci em São Paulo, logo quando você se aproxima dessa estação precisa encarnar o Darwin, enfrentar a boaiada de lado ou então você só sai lá em Jacarepaguá, ou no caso da minha linha lá no Grajau.

Por algum milagre divino, a boiada do dia estava menor e reparei que havia um homem no meio da porta atrapalhando quem queria entrar e quem queria sair, ele ria meio psicoticamente. Darwin paulistano nos ensina que não dá para ser gentil e liberar seu espaço para os entrantes mas podemos facilitar a vida deles ficando em um canto, não interferindo assim o fluxo.

Depois que o moço ficou como um João Bobo, ele gritou:

– Foi sem querer querendo!! Foi sem querer querendo!

Gelei e pensei: Estou ao lado do irreverente, que maravilha.

No eye-contact, no eye-contact! Fiz como mantra, já que atraio malucos.

Quando as portas se fecharam em Pinheiros ele apertou a tecla SAP:

– NO MORE SPACE! THIS IS TRAGIC!! NO MORE SPACE!

“Ai senhor, olha aonde eu fui parar….”

A voz que saía do alto falante demorou uma eternidade mas anunciou: Próxima Estação Hebraica-Rebouças.

Ufa, mais uma e estou livre.

Eis que nosso companheiro solta the last but, not the least:

– REBOUÇAS E REMOCHILAS!! Há, Há, Há – estilo Quico.

Alguns novos companheiros que entraram em Pinheiros deram uma risadinha e eu naquele momento só queria ligar para o Ed Motta e perguntar se ainda tinha espaço na van.

Sobre Nicole

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