JUDITH E A TORTURA CHINESA EM UM DIA BRANCO

JUDITH E A TORTURA CHINESA EM UM DIA BRANCO

O dia amanhece extremamente paulistano.

Aquela claridade branca que cega até olhos não azuis nos traz a certeza de termos acordado em São Paulo.

Eu digo a certeza de ter acordado em São Paulo em homenagem à um professor de um curso que estou fazendo. Ele sempre diz que a vida é muito louca, e que a maioria de nós sabe onde vai dormir e acordar. A maioria.

A chuva cai fina e eu preciso fazer exame de sangue.

Minha penúria começou há quase um mês, quando a nutricionista me entregou uma folha cheia de nomes estranhos. Essa folha ficou pregada na minha geladeira todos esses dias. Já era quase um membro da família recebendo até bom dia.

Retornei na nutricionista de mãos abanando e fiquei pensando comigo mesma quão péssima eu era de não ter nenhuma desculpa plausível de simplesmente não ter feito os exames.

Falta de vergonha na cara.

Saí do consultório dela decidida a fazer duas coisas:

Comer a barra de Lindt diretamente da Suiça e marcar o diabo do exame.

Adivinhem o que fez primeiro?

Lógico.

Depois, liguei para o laboratório. Fiquei, acredito, uns vinte minutos no mínimo com a mocinha do telefone, uma Judith da vida, soltetrando uns quarenta e cinco exames (Sem sacanagem… abri um Word e simulei o que eu tinha nas mãos), depois do longo e tenebroso inverno, ela fez as devidas recomendações e desejou que eu escolhesse o laboratório para realizar o exame.

Ao desligar, pensei:

Mano! (Sim, vou escrever um mano porque fica muito mais dramática a conotação.) O trabalho da mulher é compreender nomes incompreensíveis em todas as ligações que ela recebe no universo e a pessoa que está do outro da linha pode simplesmente ignorar toda a informação dada e ir ao concorrente. Ou não ir e continuar dando bom dia para a folha pregada na porta da geladeira.

Voltemos para o dia mais branco que liquid paper.

Chego no laboratório, passo por um balcão de atendimento e me mandam aguardar.

Quinze minutos depois me chamam pelo nome e me pedem para acompanhar uma moça.

Entramos em um elevador digno de filme de terror.

A certeza que ele despencaria era mais certa do que os milhões desviados pelos nossos políticos.

Sabe aqueles elevadores de hospital, gigantescos, de alumínio e que te dá a impressão que só carrega corpos sem vida?

Saí dele com vida, não me pergunte como. Loucuras da existência humana.

Aguardei mais uns trinta minutos sendo obrigada a escutar Ana Maria Braga em um Big Brother de culinária dentro do seu próprio estúdio.

As dozes horas em jejum já haviam se transformado em treze.

A moça me chama, mais vinte e cinco minutos.

Sou obrigada a assinar, acredito, umas quarenta e cinco páginas e fico pensando como eu reagiria se alguém do laboratório verificasse e constatasse que as quarenta e cinco assinaturas, feitas no meu colo, estavam divergentes com a minha habilitação.

Volto a esperar.

Nesse minuto tenho certeza absoluta que todo esse ritual é em defesa de Judith. 

É a vingança da central de trabalhadores de atendimento de laboratórios de todos os cantos do mundo, iniciado na China.

Aliás, essa burocracia toda foi o start inicial para a famosa tortura chinesa lá nos primórdios.

Depois de mais alguns bons minutos de espera, sou chamada e questionada sobre meu peso e a altura.

Tenho certeza que depois dessas quase quatorze horas sem me alimentar, peso muito menos do que dizia a balança outrora.

Ao fundo toca ALELUIA por n motivos.

A moça me fura sem dó nem piedade, como se ela fizesse isso o tempo inteiro.

E ela faz.

Vejo meu sangue esvaindo em pequenos tubos e penso que ao sair dali já estarei vestindo 38.

Quase peço para ela tirar mais, empolgada com a possibilidade de vestir realmente 38 novamente (a última vez eu deveria estar na quinta série, maldita genética do leste-europeu, cadê meus olhos claros que deveriam ter vindo no pacote?)

Mas aí lembro da Judith, filha-da-mãe, e lembro que se conseguir sair andando daquela salinha terei um achocolatado MARAVIDA me aguardando, dando de mil em muito café da manhã premium-hypado de São Paulo.

Mas para que esse texto todo, Nicole?

Ah, sei lá… Queria dividir com vocês minha teoria da tortura chinesa… E isso foi o mais perto que cheguei dela nesse dia branco.

(Se você vieeeeeer, para o que derrr e vier comiiiiigo… Eu te prometo o soooool, se hoje o sol saiiiiiir…. Ou a chuvaaaaa…. (DIA BRANCO – GERALDO AZEVEDO)

Aquela que tá muito concisa no dia dela… Começa o post falando de exame de sangue e termina com Dia Branco.

Mas sério, mudando completamente de assunto… Essa é uma das músicas mais bonitas do universo.

 

E faz todo o sentido neste dia branco, não?

 

Sobre Nicole

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